Prisioneiro
dos Sonhos
Era um entardecer chuvoso, da janela podia ver o
dia mergulhar na noite, uma sensação nostálgica, comum nos dias de chuvas. O
cheiro da umidade, um aroma próprio das tempestades, uma tonalidade de cinza e
névoa, o calor da lareira, o ambiente penetrante, como um mundo antigo
percorrendo a senda das horas frias.
Fui dormir cedo, eram 19:00, lá fora o reino da
noite chorava e eu ouvia as lágrimas caírem do telhado, elas caíam sobre a
terra e a relva, e eu fechei meus olhos, para entrar no meu descanso profundo.
Adormeci para o mundo antigo e acordei para um
mundo novo. Estava diante de uma praia de areias brancas e águas tranqüilas, um
barquinho de papel e mais além, uma ilha, chamada de Calvária.
Embarquei no barquinho de papel e segui rumo æ
Ilha.
Algumas horas depois cheguei lá, como era linda
toda aquela cena! Um paraíso adequado para ser chamado de sonho, mas aos olhos
da alma parecia tão real, um sonho bom é uma vida dentro de uma vida.
Deixe-me dar uma descrição da ilha, Calvária
tinha muitas árvores, todas eram floridas, muito parecidas com manacás, mas as
flores eram vermelhas, havia também campos de rosas sem espinhos e lavandas tão
azuis, que pareciam espelhos do céu.
Essa é uma imagem fiel do que observava. Havia
uma trilha, e eu comecei a caminhar para o interior, precisava achar uma fonte
de águas, subi um pequeno monte elevado e logo depois um vale, um pequeno lago
e uma vila, pequenas casas douradas e chaminés de barro vermelho, quando
cheguei perto, um portal anunciava boas vindas, e o nome da cidade Sarõnica.
Havia uma praça em forma de cubo de cristal e
refletia para o oriente um prisma de cores muito vivas. A cidade estava vazia,
por intuição percebi que não havia ninguém na ilha.
As ruas de Sarõnica eram de um material
desconhecido e muito vermelho. Sai da cidade e fui até o pontal do norte, onde
havia um farol, uma torre e uma lâmpada em formato de coração que emitia uma
luz azul flamejante e muito intensa.
Tão magnífica era aquela ilha, oferecia uma majestosa
tranqüilidade, voltei para a cidade, logo percebi, que uma espécie de névoa
chegava a cidade, também um vento suave, porém muito forte. Lembrei-me que o
barquinho de papel estava na praia, corri até lá e percebi que as águas
agitadas desmancharam meu barco e o papel se despedaçou.
Como poderia retornar à praia de onde parti?
Como poderia voltar ao meu mundo real? Calculei a distância e julguei quase
impossível retornar nadando. Sentei-me na praia, a névoa cobria a ilha, mas de
tal modo as partículas brilhavam, que as noites eram bem iluminadas. A razão
das névoas serem brilhantes era a praça em forma de cubo que emitia aquele
prisma.
Eu precisava encontrar uma folha de papel,
construir um novo barco para voltar pra casa, resolvi voltar para Sarõnica, ali
talvez encontrasse o papel.
Entrei na cidade, estava disposto a procurar um
livro, entrei em uma das casas, na porta havia uma descrição:
"biblioteca". Dentro, havia muitos livros, todos de capas
metálicas, de cores variadas. Tomei um dos livros, entre centenas ou talvez
milhares que haviam ali. A capa era branco prateada, abri e notei que não
haviam número nas páginas, mas o livro parecia ter aproximadamente duzentas
folhas, era um livro perfeito em todos os detalhes, e a surpresa maior foi ter
encontrado uma frase, não havia nada mais do que uma grande frase, e era
esta:
"Os bens mais valiosos que devemos buscar
na vida, são aquelas coisas pelos quais nos inspiram a viver com coragem"
Fechei o livro, fiquei olhando pela janela da
biblioteca, aquela frase me causou certo impacto, no céu azul, nuvens de
borboletas voavam com tal ímpeto como se quisessem mover as montanhas de
Calvária.
Eu precisava de uma folha de papel para fazer um
barquinho e retornar para casa, mas aqueles livros não eram do material que
procurava.
Logo descobri que cada um daqueles livros tinha
uma frase, uma mensagem que movia o nosso coração para um mergulho na
sensibilidade. Fui até outra estante, peguei um livro de capa dourada,
abri suas páginas para descobrir qual frase estava impressa ali, e fiquei
impressionado, eis a frase:
"Aquele que aprendeu a sonhar também
aprendeu a olhar a vida com os olhos do coração"
Essas palavras eram tão revolucionárias para
mim, eu decidi não retornar, ficar cativo das coisas de um mundo tão
fantástico, aprender cada lição e viver cada momento. Retornei a praia,
sentei-me na areia, contemplei o continente distante da realidade, e decidi
ficar ali, Calvária seria para sempre a minha morada...
Autor:
C. J. Jacinto
Extraído de: Contos Ordinários e Extraordinários
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