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domingo, 9 de outubro de 2022

O Bosque das Arvores Que Choram


O Bosque das
Árvores que Choram

 Clavio J. Jacinto


Todos os que  descem pelo caminho das mágoas, conhecem um bosque de muitas árvores que possuem um dom diferente, elas não frutificam e nem florescem, embora o observador perceba que há entre tantas árvores, ipês e manacás. Elas apenas choram.  Algumas crianças que por lá passaram, chamaram aquele lugar de floresta das lágrimas, eu ainda prefiro seu nome tradicional: O Bosque das Árvores que Choram. é um belo nome, senão o melhor.   Não há estações que não seja irrigada pelos choros das árvores. São gritos de muitos ias misturados com soluções épicos, uma verdadeira orquestra de sentimentos e lamentos, é possível que algo seja tão fora do normal, mas elas derramam suas lágrimas como se fossem nuvens da terra, apegadas ao chão de todas as coisas.

Este mistério foi o enigma dos séculos, talvez um enigma milenar, algo que me deixou angustiado, tentar decifrar o motivo pelo qual, arvores choram. Eu procurei respostas entre os filósofos, e eles não me deram uma boa resposta, embora muitos deles fossem argutos , então procurei os poetas, eles poderiam me dar uma resposta. Mas quando souberam da minha história e foram verificar se realmente a descida pelo caminho das mágoas levava a esse bosque tão misterioso, chegando lá, ficaram tão sensibilizados que acabaram voltando chorando. Era como se os lamentos das árvores se apoderasse do coração deles. Não tive as respostas, mas continuei a procura. Encontrei um profeta, falei a respeito de minhas indagações acerca de um bosque onde as árvores não florescem e nem frutificam, apenas chora, o ano todo. O profeta também ficou pensando sobre o mistério e não deu uma resposta satisfatória.

Teria que procurar, ainda que tivesse que correr todo o mundo em busca de alguém que pudesse me dar uma resposta sobre um assunto tão controverso quanto  árvores se comportam como se fosse  humanos infelizes, ou ainda como almas crepitando nas dores das chamas de uma chaga.

Desci ao caminho das mágoas, me sentei embaixo de um salgueiro, em união com o silencio do meu coração, para ouvir os lamentos da floresta. Ouvia os pingos dessa chuva lacrimejante sobre as folhas, torrenciais insólitos de um mistério que não podia desvendar, arvores não tem sentimentos, pensava eu, ou elas sentem?

De fato, percebi que, apenas alguns minutos debaixo do salgueiro e já estava encharcado de lagrimas.

Retornei sem uma resposta, minha vida estava sob o peso esmagador das coisas indecifráveis. Mas deveria continuar buscando, entre faias e ciprestes colhi em um cálice algumas lagrimas, eu tive a idéia de levá-las ao químico, para que observasse o fenômeno e me desse uma resposta, afinal de contas as árvores não tinham glândulas lacrimais, como poderiam chorar ?

Mas ele também não me deu respostas, apenas argumentou que há no universo certos tipos de mistérios que não podemos decifrar, pois se encontram dentro de uma caixa tão fechada que ao guardadas pelo silêncio na multidão de milênios.

A vida tece uma veste de enigmas, e ela apenas faz, para cobrir a nossa ignorância de vergonha.

Voltei pelo caminho das mágoas, eu teria que levar comigo uma criança, talvez ela pudesse me ajudar a decifrar o mistério das árvores que choram, quando chegamos lá, a criança nada falou, apenas abraço-se á uma cerejeira e começo a chorar com ela.

Tomei a criança pelas mãos e comecei a chorar com ela, agora eram arvores, uma criança e um adulto chorando. Pelo jeito o mar da angústia vai transbordar e inundar toda a terra.

Decidi sair dali, pensei que deveria existir um bosque de árvores risonhas, mas tentei imaginar onde seria a localização de um bosque de árvores dando risadas. Outra idéia surgiu no coração, e se existisse um bosque de árvores que cantam? Sacudi a minha cabeça, devo estar ficando louco.

Voltando ao mundo normal, lá onde árvores não cantam, não dão risadas e nem choram, tentei coordenar o meu coração, para tentar achar uma resposta para o caso tão enigmático que estava envolvido.

Pensei comigo mesmo que, se permanecesse frente ao bosque ouvindo as árvores chorando e meditando sobre o motivo pelo qual elas fazem isso, talvez encontrasse uma resposta dentro de meu próprio coração.

Mas outra idéia surgiu, consultar todos os livros de biologia, as enciclopédias poderiam ter uma resposta, é certo que a ignorância é um estado de escuridão, aguardando que uma luz de sabedoria acesa em outro lugar seja encontrada e colocada no recinto onde ela perdura.

Passei dias e mais dias abrindo livros e mais livros e nunca encontrei as respostas que precisava, até que um dia olhei no espelho, e vi a mim mesmo, um homem de face envelhecida e mãos trêmulas.

Um homem que viveu na humanidade, que viu guerras e injustiças, que lutou para sobreviver, que carregou fardos e enfrentou tantos problemas, agora já fraco, com os pés calejados e o coração desgastado por bater em todas as estações.

Era o fim da minha vida, o ceifar de meus pensamentos e ações, o caminho linear da existência. Passamos a vida em busca de respostas quando deveríamos viver a vida em busca de perguntas.

Desci o caminho das mágoas, voltei ao bosque, apoiado por uma bengala, já caminhando com dificuldades. Aquele pé de salgueiro ainda estava lá, continuava chorando.  Aproximei-me dele, as árvores quando sentiram a minha presença, um velho homem de pele retorcida e ossos frágeis, todas pararam de chorar. Era como se fosse um milênio de silêncio sacro. O salgueiro silencioso sentiu os meus braços, abracei-me á ele, e quando todas as árvores do bosque das árvores que choram se silenciaram diante da minha existência última, penas eu chorei e chorei muito, enquanto elas apenas me ouviam. Desde então, o bosque das árvores que choram, perderam suas folhas, silenciaram na noite da minha partida, e apenas restou uma pequena roseira que floresceu, entre a fenda de uma pedra, sem nunca murchar, pela multidão dos séculos, apenas para perpetuar os mistérios da vida.

 


Extraído de: Contos Ordínarios e Extraordínarios.


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