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quarta-feira, 17 de setembro de 2025

Compreender o Amor

 Há uma frase atribuída a Clarence Jordan, do qual ele disse assim: “A medida de um cristão não está no auge de seu alcance, mas na profundidade do seu amor.” Diante de nós, deve haver uma compreensão precisa. No amor, não há elementos abstratos. O amor é uma experiência intensa, profunda, dinâmica e transformadora. Por isso, Jesus, em seus ensinamentos, declara que um dos maiores mandamentos é amar o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento. Essa é uma clara indicação de que devemos amar a Deus profundamente, assim como devemos amar o próximo com a mesma profundidade e intensidade. Reconheço que isso representa um desafio significativo nos dias atuais, pois a sociedade parece cada vez mais centrada no indivíduo. A ênfase no amor-próprio, desvinculada do amor ao próximo e a Deus, pode ser vista como uma característica da conduta humana que se manifesta nos tempos atuais.

 O amor é o mais nobre dos sentimentos. Ele se manifesta de forma singular no homem piedoso, aquele que se dedica à santidade. Para este, o amor a Deus é preeminente, abrangendo todo o ser: coração, alma e mente. Este amor transcende a própria existência, valorizando a verdade divina acima da segurança pessoal.

 Observamos essa devoção, por exemplo, na vida de Daniel, durante o exílio na Babilônia. Para ele, amar a Deus representava uma fidelidade inabalável. Daniel amava a Deus sobre todas as coisas. Toda sua vida era dedicada ao serviço e à busca da vontade divina.

Podemos observar a manifestação desse amor na vida dos mártires. Eles demonstraram plena disposição para sacrificar suas vidas em prol do evangelho e por amor a Cristo. Não se apegaram às suas próprias vidas, enfrentando a morte com coragem. Trata-se de um amor extraordinário, cuja característica principal é a fidelidade. Todo homem verdadeiramente piedoso ama a Deus acima de todas as coisas.

 Recordo uma frase que me impactou no início da minha jornada de fé, atribuída a Watchman Nee, possivelmente proferida durante seu encarceramento e nos últimos dias de vida, em razão de sua fé. Ele teria dito: "O preço que estás disposto a pagar pelo Senhor determinará o amor e o valor que Ele terá em tua vida." Considero que essa frase encapsula a essência do amor a Deus, pois foi expressa por um homem que, aprisionado e à beira da morte, manteve sua fé inabalável. Ele não considerou sua própria segurança, nem seus interesses pessoais, mas fixou seu olhar em Jesus, o autor e consumador da fé, reconhecendo-o como algo de valor inestimável, pelo qual valia a pena amar e, se necessário, morrer.

 Foi essa a postura de Watchman Nee, o mártir. E é essa mesma postura que molda um homem verdadeiramente piedoso.

 

C. J. Jacinto

 

O Fluxo da Existência - C. J. Jacinto

 



O Fluxo da Existência 



Caminho por essa via rápida

A vida

Em dimensões longínquas

Um fugitivo

Decifrando enigmas e montanhas

A vastidão dos pensamentos

A estigmatização da alma

Flagelos do tempo e cicatrizes

Os pormenores da antiguidade 

As décadas guardadas no passado

Nas caixas acústicas de minha memória 

A aurora que amparou a vírgula

Da frase que fez divisa do real e o sonho

No assombro de imaginações infantis

Me dou conta que ainda existo

E se Deus quiser

No esquecimento ainda serei lembrado.


C. J. Jacinto.


Portais Eternos

 Portais Eternos


Flui do dia meus anseios 

De ver distante meus sorrisos 

Que desabrocham nas manhãs invernais 

A foz naufraga de meus gritos

No silêncio que o eco desfaz


Sonhos transitam incertos

Flutuam nas nuvens de Magalhães 

Nos tormentos de mares e cais

A lágrima solitária que cai armada

Na névoa áurea que o sol desfaz


As ondas bravas desbravam a areia

Anuncia o vau de  cantos árticos 

Do frio atroz que enrijece  mais

Nas noites destiladas do orvalho fausto

O meu opróbrio que ataca sagaz 


Ah meu tempo que desliza aurora

Quando a tarde  salta as horas 

No céu que cintila a espera mais audaz 

Estou sóbrio e olho firme o vórtice 

Aguardando a vinda da eterna paz


Quando pois enfim o fim 

Que aguardo aos finitos prantos  

No passado finado expirou os "ais'

Contemplo o Principio e o Fim

E régio cântico de entrada aos portais


C. J. Jacinto

Chuvas da Primavera C. J. Jacinto

Chuvas da Primavera

 

C. J. Jacinto



Hoje, o dia apresentou uma singularidade. Apesar de ser uma manhã primaveril, o canto dos pássaros foi substituído pelo som da chuva a cair sobre o telhado. Um dia nublado, carregado de águas e da melancolia que as acompanha. Nem mesmo os trovões, em sua profundidade, conseguiram dissipar essa tristeza que se apegava às nuvens. Da janela do meu quarto, observei a névoa envolvendo a vegetação, como um véu. Considero as montanhas semelhantes a esse véu, dissolvendo-se na imaginação e ocultando os receios que habitam nosso interior. Empunhei meu livro e, em sua leitura costumeira, busquei uma fuga da melancolia, um portal para outra dimensão, o universo da imaginação, onde meu coração pudesse interagir com a narrativa.

 Ao término da leitura, a seguinte questão emerge: enquanto me deleitava com a cena jubilosa nas páginas daquele livro antigo, outrora silencioso na estante de minha biblioteca, meu coração se enchia de júbilo. Ao acompanhar a narrativa daquela grande aventura, comecei a refletir sobre como podemos nos transportar de uma realidade melancólica para uma fantasia plena de alegria, vivenciando-a de modo tão intenso que a sentimos real, e nos libertando completamente do cenário original. Onde as sombras da monotonia, representadas pelas "chuvas", pareciam minar nosso ânimo, conduzindo-nos a um estado de desânimo e letargia.
 Após imergir na melancolia, que, por sua vez, evoca a nostalgia, poderíamos discorrer sobre o universo que se manifesta em nosso interior como um renascimento. A melancolia, neste sentido, permite-nos recordar momentos pretéritos e, com eles, a saudade, uma saudade intensa. Refiro-me àquela saudade da infância, quando observávamos a chuva e, nela, vislumbrávamos a felicidade plena, a possibilidade de brincar na lama e viajar em um mundo aparentemente cinzento, mas que aos olhos infantis resplandecia em todas as cores. Era como se pudéssemos contemplar o arco-íris, antes que a tempestade se dissipasse. A percepção de uma criança, de fato, transcende o instante presente, ultrapassando a realidade imediata e revelando perspectivas além das fronteiras do espaço e do tempo.

 É lastimável que tenhamos perdido essa perspectiva, essa visão infantil, e, por conseguinte, deixamos de contemplar a chuva através da janela, incapazes de enxergar nos pingos que caem sobre o telhado a alegria que outrora nos proporcionavam. Ao invés disso, a tempestade e as chuvas intensas evocam em nós sentimentos profundos de tristeza, como se o próprio céu lamentasse conosco. Desta forma, parte de nossa existência se dilui nesse mar de nostalgia, no qual nos vemos presos, como se um dia chuvoso fosse um cárcere, uma prisão que impede a nossa alma de transcender o espaço em que fomos confinados. Com o olhar, percorremos o ambiente, avistando apenas chuva e névoa, um mundo completamente cinzento, como se a água torrencial banhasse todas as flores.

 Contudo, cumpre ressaltar que, nos momentos em que, absortos, contemplamos a chuva através da janela e nossa alma se entrega à melancolia da paisagem, sentindo apenas a nostalgia de um dia chuvoso, podemos encontrar abrigo nos livros. Ao abrirmos as páginas de uma obra cativante, nossa mente se transporta para a narrativa, e a lembrança da infância ressurge. Começamos a vislumbrar um mundo interior, refletido nas palavras do livro. Um novo universo se revela, repleto de paisagens deslumbrantes, estrelas cintilantes, flores exuberantes, aromas inebriantes e alegria. Um mundo de fantasias, que paradoxalmente se manifesta com tamanha vivacidade a ponto de ofuscar o dia. Uma realidade que permeia nosso amanhecer.

 Nesse universo, contemplamos camelos majestosos, constelações cintilantes e galáxias longínquas. Um mundo onde as águas do mar encontram a areia, e as conchas parecem sussurrar uma melodia imaginária, despertando alegria e movimento em nosso ser. Observamos campos verdejantes, exploramos cidades e vilas, encontrando personagens que moldam nossas emoções, provocando lágrimas ou sorrisos. Contudo, a transformação é constante. A rotina se desfaz, dando lugar a um novo universo, onde nossa alma pode vagar livremente. Encontramos, na narrativa, um espaço para nossa jornada, enquanto a chuva cai suavemente. Penetramos nesse mundo, explorando-o e nos tornando parte dele, como se existisse uma dimensão paralela à nossa. Isso nos leva a refletir sobre os múltiplos aspectos da vida, sobre a possibilidade de vivermos existências além da nossa, e sobre a vastidão do universo que nos cerca. Tal qual o universo, nossa alma, um dia, poderá habitar outro espaço, ao deixarmos este mundo.

 Em meio às páginas de um livro antigo, onde um universo se revela à nossa alma, mesmo que a chuva intensa insista em permear o nosso dia a dia, a rotina se dissolve, permitindo-nos vislumbrar o mundo dentro de outro mundo. Uma jornada mística que nos convida à introspecção. É por meio desse universo que, muitas vezes, devemos trilhar o nosso caminho, buscando a alegria, enquanto, do lado de fora, na chuva, a tristeza pode nos alcançar. Talvez seja assim, pois as chuvas são essenciais para o mundo. Contudo, nossa alma amadurecida pode ter dificuldade em enxergar cores sob a tempestade. Faz parte da nossa perspectiva, uma visão moldada pelos anos vividos, onde deixamos para trás as fantasias da infância. Resta-nos, portanto, a esperança, a esperança que reside em um bom livro, lido na poltrona, ao lado de uma lareira. Com o fogo a crepitar, página após página, podemos nos encantar com florestas exuberantes, com o sol a iluminar as árvores, com cachoeiras a cair e com nuvens a flutuar sem trazer a melancolia da chuva.

 Meu sorriso será audaz, amplo como as dobras de um manto, o manto noturno que cobre miríades de estrelas. É o magistral relato, a narrativa contida em um livro, de um autor desconhecido, e um mundo que se revela à minha imaginação. É como se minha mente se expandisse para um universo distinto, onde minha alma navega e flutua sobre campos de flores exuberantes. É como se minha alma pudesse apreender todos os aromas, todos os perfumes, e extasiar-se com as campinas e fontes cristalinas. As ilhas próximas a mim se apresentam em toda a sua beleza. É como se eu pudesse tocar as estrelas, e elas iluminassem meu interior, onde minha alma jamais se perturba com o medo. O medo da escuridão cósmica. Assim, o dia transcorre, e a melancolia é dissipada por um livro. Um livro que abriga um mundo diferente, uma história distinta, e quebra a tristeza que por vezes permeia minha vida. Mais do que isso, permite que a alma viaje às profundezas de um outro cosmos, onde, em vez de sucumbir à nostalgia de um dia chuvoso, encontro alegria. Uma alegria plena, completa, ao acompanhar a história narrada por um escritor que nunca conheci e por um livro que, por muito tempo, permaneceu silencioso em minha biblioteca.

 

Fundamentos da Aspiração

 Fundamentos da Aspiração


Fim da noite

A serenidade desta alvorada precoce,

Como um navio fecundo que navega,

Transpôs o reino da luz.

Da porta aberta, contemplo cenas em movimento.

Névoas e trovoadas

Repousam em sementes de fogo,

Em uma distância sempre presente.

Próximo ao absoluto, próximo ao vazio,

Em universos sem rumo,

Em um instante sem divisão.

Dissimulo meus desejos, minhas mágoas.

Aborvo-me na fonte de todas as essências,

E descubro, enfim,

Que despertei feliz.


C. J. Jacinto